A fraude do “falso advogado” que circula em Balneário Camboriú ganhou um ingrediente que transforma um golpe digital em um problema sistêmico: a falha de checagem na ativação de linhas móveis. A Vivo reconheceu que habilitou indevidamente o número (47) 99xxx-xxxx em nome do consumidor — e cancelou a linha. Porém, a empresa não entregou nenhum dos elementos técnicos que permitem seguir o rastro do criminoso: contrato/aceite, canal de venda, IPs e identificadores do dispositivo, horário exato, geolocalização do atendimento, identificação do atendente ou do terminal utilizado, tampouco indicou um responsável para recebimento de provas e interlocução com a vítima.
Esse vazio de informações produz um efeito concreto: sem dados de rede e de ativação, a vítima não consegue demonstrar a autoria material da habilitação e as autoridades têm mais dificuldade para identificar o ponto de origem (loja, app, parceiro comercial), o dispositivo utilizado e a possível participação de terceiros na cadeia. Ao não franquear logs e documentos — mesmo após um pedido formal detalhado — a empresa flerta com a conivência por omissão: cancela, mas evita transparência, deixando o rastro do golpe na penumbra.
O contexto local demonstra como a engrenagem criminosa depende dessa sombra. Com dados pessoais capturados, golpistas se apresentam como advogados, citam processos reais e, com números “limpos” recém-ativados, conduzem as vítimas a uma vídeo-chamada “para liberar valores”. O passo seguinte é a exigência de compartilhamento de tela, quando capturam códigos de autenticação e senhas e, às vezes, partem para intimidação. Sem a resposta técnica completa da operadora, o elo crítico — quem abriu o chip e por qual canal — permanece sem lastro público.
Numa boa prática de resposta a incidentes, a operadora deveria: 1) preservar e compartilhar com a vítima (e, quando acionada, com a polícia) o pacote mínimo de evidências técnicas; 2) apontar um canal técnico responsável (nome e e-mail corporativo) para a cadeia de custódia; 3) auditar e reportar o canal que permitiu a ativação indevida; 4) implantar salvaguardas para novas habilitações (verificação reforçada, alertas proativos por e-mail/SMS e bloqueio por suspeita de identidade).
Enquanto a Vivo opta por comunicar apenas o cancelamento e a ausência de débitos, os criminosos seguem explorando o mesmo atalho: habilitações em nome de terceiros para dar aparência de legitimidade às abordagens. Transparência técnica não é favor — é peça central para interromper o ciclo do golpe e responsabilizar quem lucra com ele.

