A morte do recém-nascido Ragner Ramos Leitemperger durante o parto, no Hospital Municipal Ruth Cardoso, desencadeou uma crise administrativa e expôs falhas graves no atendimento obstétrico da unidade. O episódio gerou forte comoção pública e resultou, poucos dias depois, na exoneração de Andressa Bertiel Willeke Hadad do cargo de diretora-geral do hospital, conforme portaria nº 32.770/2025, assinada pela prefeita Juliana Pavan nesta segunda-feira (28).
Nomeada no início da atual gestão, em 2 de janeiro de 2025, Andressa vinha comandando a instituição em um momento considerado sensível, mas acabou sendo retirada do posto em meio às denúncias de negligência médica, omissão de socorro e inconsistências nos documentos emitidos após o óbito do bebê.
Andressa afirma que foi retirada do cargo
Em conversa com a reportagem, Andressa afirmou que não pediu exoneração, mas que foi retirada pela prefeitura. “Jamais pediria exoneração em um momento tão delicado que o Ruth passa”, declarou. Em carta aberta enviada aos servidores do hospital, ela relatou os desafios enfrentados durante sua gestão: “Foram dias muito intensos e difíceis, onde vi a crueldade humana se desenhar frente aos meus olhos, conheci algo jamais visto em meus 24 anos de atuação profissional, mas o que me orgulho ainda mais é que não me corrompi”.
Sem entrar em detalhes sobre as circunstâncias da exoneração, Andressa criticou a condução da gestão de saúde no município, afirmando que “o ego, ganância e poder hoje predominam frente à Secretaria de Saúde” e concluiu: “os dias mostrarão o fim derradeiro”.
Andressa também deixou um recado para a prefeita Juliana Pavan: “A Prefeita Juliana Pavan agradeço pela confiança e que tenhas pulso firme e mude o cenário desenhado na Secretaria Municipal de Saúde de Balneário Camboriú (SMSBC)”.
Críticas públicas à gestão da saúde
O marido da ex-diretora, conhecido como Olodum, também se manifestou nas redes sociais, fazendo duras críticas à gestão municipal e ao modelo de terceirização dos serviços médicos. Em comentários públicos, ele denunciou a permanência de empresas médicas que, segundo ele, já deveriam ter sido afastadas:
“Tem equipe de médicos nesse hospital que não deveriam ali estar, e isso já vem desde o outro governo. Espero que o atual governo reveja a situação, retirando as empresas que compõem esses médicos que negligenciam a vida humana.”, escreveu. Em outro comentário, ele responsabilizou diretamente a Secretaria de Saúde: “Tenho informações que isso ocorre com frequência no Hospital Ruth Cardoso. Devem ser investigados os médicos donos das empresas que continuam a vencer as licitações, e a Secretaria de Saúde por permitir que essas empresas continuem mesmo após serem consideradas incapacitadas. Portanto, o sangue dessa criança também está nas mãos da secretária de saúde.”
Nota da prefeitura e medidas anunciadas
Em nota oficial, a Prefeitura de Balneário Camboriú informou que a secretária municipal de Saúde, Aline Leal, assumirá interinamente a direção do Hospital Ruth Cardoso a partir desta terça-feira (29), acumulando ambas as funções. Segundo a administração, o objetivo é “garantir a continuidade dos atendimentos e manter a estabilidade da gestão enquanto as mudanças planejadas avançam”.
Entre as medidas anunciadas estão:
- Substituição de membros da equipe diretiva do hospital ainda nesta semana;
- Envio de um Projeto de Lei à Câmara para permitir a contratação de profissionais ACTs da Saúde com vínculos de dois anos;
- Criação do cargo de diretor clínico obstétrico para a maternidade;
- Lançamento de nova licitação para gerenciamento do Centro Obstétrico, permitindo a rescisão do atual contrato emergencial;
- Abertura de auditoria interna pela Controladoria-Geral do Município para apurar a execução do contrato vigente da maternidade.
Mudança na gestão hospitalar e busca por certificação
Além das medidas emergenciais, a prefeitura anunciou que iniciará o processo para buscar a certificação da Organização Nacional de Acreditação (ONA) para o Hospital Ruth Cardoso. A acreditação da ONA é considerada um dos mais importantes reconhecimentos de qualidade hospitalar no país, priorizando a segurança do paciente, a gestão eficiente e a humanização no atendimento.
O governo municipal também informou que, ainda este ano, lançará nova licitação para mudança completa na gestão hospitalar. O processo anterior de concessão, iniciado em 2023, foi cancelado após pareceres contrários emitidos pelo Ministério Público de Santa Catarina e pelo Tribunal de Contas do Estado, que apontaram inviabilidade financeira e falta de projetos técnicos detalhados.
Contexto da crise
A crise expôs fragilidades antigas no modelo de gestão do Ruth Cardoso, especialmente na terceirização de serviços médicos e no acompanhamento da qualidade assistencial. A morte do recém-nascido e a posterior exoneração da diretora acontecem em meio a uma crescente pressão popular por mais transparência e melhorias no atendimento hospitalar, especialmente na maternidade.
O caso segue sendo investigado pela Polícia Civil e justiça, que devem apurar responsabilidades administrativas, civis e criminais em relação à morte do bebê.