O artista de rua Kauan Quadros Serafim, conhecido por interpretar o cover da personagem Dona Hermínia e suplente de vereador pelo PSD, denunciou a Prefeitura de Balneário Camboriú após ser exonerado no dia 25 de março de 2025. Segundo Kauan, em menos de dois meses de governo, ele foi nomeado para quatro cargos diferentes, o que ele considera uma estratégia de perseguição política e intimidação por parte dos gestores municipais.
Sua primeira nomeação ocorreu em 9 de janeiro, como coordenador de RH da Assistência Social, lotado na Secretaria de Gestão de Pessoas. Pouco depois, foi transferido para a função de coordenador da Casa da Família, na Secretaria de Assistência Social, Mulher e Família, em 31 de janeiro. No início de fevereiro, passou a ocupar o cargo de coordenador administrativo na Fundação Cultural de Balneário Camboriú e, em 17 de fevereiro, foi realocado para a Secretaria da Pessoa Idosa como coordenador de Relações Institucionais, Políticas e Projetos. Para Kauan, essa movimentação constante dentro da administração municipal foi usada como uma forma de retaliação, culminando em sua exoneração.
O caso culminou em um boletim de ocorrência lavrado no dia 13 de março de 2025, que relata um episódio de constrangimento ilegal e intimidação, que envolve o chefe de gabinete da prefeita Juliana Pavan, Leandro “Índio”, Allan Müller Schroeder, diretor da Fundação Cultural, e Ed Rocha Junior, outro integrante da equipe da cultura.
O boletim de ocorrência registrado por Kauan Quadros Serafim apresenta três denúncias principais: sua remoção sucessiva das secretarias municipais, a proibição de expressar opiniões e a censura que sofreu ao ser impedido de se manifestar em suas redes sociais.
Em conversa com nossa equipe, Kauan explicou que, no momento do registro do boletim, estava muito nervoso e acabou não detalhando o motivo específico de sua exoneração. No entanto, relatou com riqueza de detalhes os acontecimentos que marcaram sua passagem por cada secretaria, apontando episódios que, segundo ele, demonstram um padrão de perseguição política dentro da administração municipal.
Primeira exoneração
No boletim de ocorrência, consta que Kauan foi inicialmente designado para exercer a função de coordenador da assistência social. No entanto, pouco tempo depois, foi transferido para outra secretaria, assumindo o cargo de coordenador administrativo na Fundação Cultural.
Em conversa com nossa equipe, ele relatou que, apesar da designação oficial, na prática, foi colocado para coordenar as abordagens sociais nas ruas da cidade, uma nomeação que nunca foi formalizada. Kauan afirma que se identificou profundamente com esse trabalho, pois desejava atuar na implementação de políticas públicas voltadas ao atendimento de pessoas em situação de vulnerabilidade. “Depositei minha fé e força por quem estava em situação de rua”, declarou.
Ele aponta que um dos motivos para sua exoneração foi a tentativa de organizar a escala de trabalho da equipe de abordagem social. Segundo Kauan, funcionários chegavam com até duas horas de atraso e não registravam ponto. Além disso, recebeu orientação para evitar que os agentes mantivessem vínculos muito próximos com os moradores de rua, a fim de preservar a autoridade da função. Ele conta que seguiu essas diretrizes, mas acabou sendo visto como o responsável por um problema já existente.
Outro episódio que, segundo Kauan, foi determinante para sua saída envolveu a recepção de doações destinadas às vítimas das enchentes em Balneário Camboriú. Ele relata que recebeu duas carretas vindas do Rio Grande do Sul e informou a todos sobre a chegada dos donativos. A recepção das carretas foi acompanhada por um evento na Casa da Família, com café e bolo para as pessoas que trouxeram os suprimentos. No entanto, após a entrega, recebeu ligações de seus superiores, sendo duramente repreendido pela decisão de aceitar os donativos. O argumento foi de que a cidade não precisava daquela ajuda.
Kauan destaca que o episódio ocorreu na véspera do mutirão de limpeza do Hospital Ruth Cardoso, uma ação promovida pela prefeita e seus apoiadores. Segundo ele, foi pressionado a comparecer ao mutirão, mas recusou, pois estava exausto após a recepção das doações e o descarregamento dos caminhões. Essa decisão resultou em um forte chamado de atenção por parte da chefia.
Para Kauan, a repercussão positiva do recebimento dos donativos incomodou alguns membros da administração municipal, que não teriam gostado da atenção gerada para seu trabalho na abordagem social. “Alguém ficou mordido e ordenou minha saída da Abordagem Social porque disseram que eu estava aparecendo demais”, declarou.
Segunda exoneração
A segunda exoneração de Kauan aconteceu de maneira relâmpago. No dia 31 de janeiro, ele foi nomeado como Coordenador da Casa da Família, vinculada à Secretaria de Assistência Social, Mulher e Família. No entanto, apenas um dia depois, em 1º de fevereiro, foi exonerado dessa função e imediatamente realocado para o cargo de Coordenador Administrativo na Fundação Cultural de Balneário Camboriú. Um sinal de que nem o governo muinicipal sabia onde alocar Kauan.
Terceira exoneração
De acordo com o boletim de ocorrência, ao ser transferido para a Fundação Cultural de Balneário Camboriú, Kauan foi impedido de exercer a função para a qual havia sido nomeado. Em vez disso, foi incumbido de trabalhar como porteiro no Teatro Municipal Bruno Nitz, uma atribuição que não correspondia ao cargo que deveria ocupar.
Ainda segundo o relato, o presidente da Fundação Cultural, Allan Müller Schroeder, removeu Kauan dos grupos de comunicação interna da Fundação e do Teatro, além de impedir seu acesso ao espaço ao não lhe fornecer as chaves.
Nas redes sociais, Kauan denunciou a situação, relatando que sequer conseguia bater o ponto, pois não podia entrar no teatro. Sem acesso e sem poder desempenhar suas funções, mais uma vez, foi deslocado para outra secretaria.
Quarta exoneração
Quadros foi nomeado como Coordenador de Relações Institucionais, Políticas e Projetos da Secretaria da Pessoa Idosa no dia 17 de fevereiro. No entanto, ele afirma que, mais uma vez, foi colocado em uma função sem autonomia e sofreu novas intimidações dentro da administração municipal. No boletim de ocorrência, Kauan relatou um episódio ocorrido no dia 12 de março, durante uma reunião no Teatro Municipal Bruno Nitz, que culminou no que ele considera mais um ato de perseguição e censura dentro do governo.
A reunião foi organizada por gestores da Fundação Cultural de Balneário Camboriú e integrantes da Câmara Setorial de Artes Populares e Circo, e contou com a participação de diversos artistas da cidade. O objetivo era debater políticas públicas voltadas para os artistas de rua e discutir a destinação de recursos culturais. Durante o encontro, Kauan expressou sua insatisfação com a decisão da Fundação Cultural de utilizar R$ 150 mil da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura para financiar o restauro da Casa Linhares e a manutenção do galpão anexo. Ele argumentou que essa verba deveria ser investida diretamente em artistas locais e que a obra deveria ser custeada pela Secretaria de Obras, sem comprometer o orçamento da cultura.
Assim que fez essa crítica, Kauan afirma que foi repreendido por Allan Müller Schroeder, presidente da Fundação Cultural, que o interrompeu e afirmou que ele não poderia expressar sua opinião publicamente por ser funcionário da prefeitura. Além disso, Allan teria debochado de Kauan repetidamente e, no meio da discussão, expôs publicamente o valor exato do salário que Kauan recebia da administração municipal.
Essa atitude gerou desconforto entre os presentes, e um dos artistas que acompanhavam a reunião confirmou a versão de Kauan, destacando que a exposição do salário foi completamente desnecessária e constrangedora. “É verdade mesmo. Eu achei até muito baixo da parte deles fazer isso, expor o salário do cara ali, nada a ver. Se bem que quem recebe salário da prefeitura está no portal da transparência, mas para que a necessidade de fazer isso? Ele estava ali como artista, não como funcionário. Quem estava representando o governo eram eles”, declarou o artista.
Kauan conta que se sentiu censurado e humilhado, especialmente porque, naquele momento, estava participando do encontro fora de seu horário de trabalho e na condição de artista de rua, não de funcionário da prefeitura. Ele rebateu Allan e argumentou que, como cidadão, tinha o direito de se manifestar sobre decisões que afetavam a classe artística.
Segundo o boletim de ocorrência, Kauan supõe que Ed Rocha Junior, responsável pelas artes da Fundação Cultural, tenha ligação com Leandro Índio, chefe de gabinete da prefeita Juliana Pavan, e que Ed teria gravado um vídeo com o objetivo de que Leandro fosse até o teatro para intimidá-lo.
Diante da situação, Kauan resolveu gravar um vídeo expondo o que estava acontecendo. Na gravação, ele aparece visivelmente indignado e menciona o que considera perseguição dentro da administração municipal. Segue a transcrição do vídeo:
“Pessoal, eu estou aqui agora no teatro. Esse aqui é o braço direito da Juliana Pavan, tá? O Índio foi chamado, chamado porque eu vim aqui no teatro, na reunião do conselho que fizeram pra decidir, enfim, mostrar pras pessoas como que se faz isso, como se faz aquilo. Eu estou aqui bem no centro disso porque o espaço, o teatro é meu também. E é sobre isso que vocês têm que entender. A perseguição existe, eles fazem isso a torto e a direito. Tá bom? E eu não falo olhando no teu olho. Eles fazem isso. Prestem bem atenção, gente. Olha lá, não estava aqui, foi chamado, né, porque eu estava questionando aqui os meus direitos como cidadão. O presidente da cultura de Balneário Camboriú, debochado por sinal, mas também do partido que era, não poderia ser diferente. Então nós temos aqui o Allan do PDT, não é mesmo? Deixar ele famosinho aqui, tá, gente? Eu estou falando desse jeito porque eu fui humilhado diante de todo mundo aqui, olha. Humilhado, está certo? Falaram até o salário que eu recebo na prefeitura. E eu estou aqui fora do meu horário de trabalho, estou aqui fora do meu horário de trabalho. O que eu achei absurdo é que, como cidadão, como artista, como todos aqui, como todos, e todos viram essa palhaçada, todos viram. Isso não está certo, está certo? Entendam, e este espaço aqui é pra artista de verdade, está bom? Faça uma faculdade primeiro pra vir aqui falar merda.”
Além disso, Kauan usou suas redes sociais para explicar por que acredita que foi alvo de perseguição por parte do chefe de gabinete da prefeita. Ele aponta que dentro da administração municipal há “os preferidos” e aliados políticos, e que seu enfrentamento direto com a gestão cultural da cidade pode ter sido o motivo da forte retaliação que sofreu.
“Aí eu sei que muita gente se pergunta: ‘Mas como que o chefe da Casa Civil se invaretou e se encarnou num simples coordenador que recebe uma miséria, vamos botar assim? Por que que se invaretou tanto?’ Sabe por quê, gente? Porque dentro da política existem os seus preferidos, os seus amigos, os aliados. E aí eu fui aquele camarada que, dentro da cultura, vendo tudo o que estavam fazendo comigo, enfrentei sim! Enfrentei o diretor de artes, enfrentei sim o presidente da Fundação Cultural. Só que o diretor de artes é muito amigo do chefe da Casa Civil. Então ele foi proteger o amiguinho, foi defender o amiguinho, entende?”
Quinta Exoneração
Após o episódio do teatro Kauan registrou um boletim de ocorrência relatando os eventos de intimidação e censura. A situação culminou na sua exoneração definitiva, assinada no dia 25 de março de 2025.
Censura nas redes sociais
Além das mudanças de cargos dentro da prefeitura, o boletim de ocorrência também relata que Kauan teve suas redes sociais monitoradas pelo chefe da Casa Civil, Leandro Arthur Rodrigues da Silva. O documento registra que “Leandro, que já tinha conhecimento de toda a situação, passou a observar as atitudes do comunicante. Em determinado momento, repreendeu Kauan por um comentário feito em uma publicação no Instagram de uma deputada estadual”.

Segundo Kauan, o episódio aconteceu após ele comentar uma postagem da deputada estadual Ana Caroline Campagnolo (PL), na qual a parlamentar criticava a secretária de Comunicação de Balneário Camboriú, Dagmara Spautz. O vídeo da deputada destacava que Dagmara, enquanto jornalista da NSC, expunha os gastos com diárias de políticos, mas, agora no governo municipal, havia utilizado R$ 4.207,52 em uma viagem para Brasília, com uma diária individual de R$ 1.294,62. No vídeo, Ana se referiu à secretária como “jaguarinha”.
Kauan, ao assistir a publicação, comentou: “Sua jaguarinha foi ótimo 🤣🤣🤣👊”. Pouco depois, recebeu uma mensagem de Leandro Índio, repreendendo-o:
“Rir de um comentário que ofende uma secretária do governo não é legal. Se alguém do governo fizer isso com você, me chame que vou chamar a atenção. A secretária foi chamada de jaguarinha e você acha ótimo… convenhamos.”
Segundo Kauan, ele se sentiu pressionado a apagar o comentário, pois temia represálias e a perda do cargo.
Diante do caso, a equipe do portal entrou em contato com a deputada Ana Campagnolo para questionar sua opinião sobre a situação e a alegação de perseguição política contra Kauan. Ana respondeu com críticas diretas à secretária Dagmara e à administração municipal:
“A secretária Dagmara é quem deveria ser exonerada. Antes de negociar seus supostos valores em troca de um cargo público, ela criticava o uso de diárias dos políticos. Gastou mais de 4 mil reais para acompanhar a prefeita, e é normal que as pessoas questionem esse comportamento hipócrita. Além do mais, o rapaz demitido por causa da secretária é homossexual. Outra hipocrisia, pois Dagmara sempre arrotou ser defensora de minorias.”
Kauan Quadros denuncia falta de apoio de Juliana Pavan
O artista e suplente de vereador Kauan Quadros Serafim relata que, após registrar um boletim de ocorrência denunciando perseguição e intimidação dentro da Prefeitura de Balneário Camboriú, buscou apoio da prefeita Juliana Pavan, a quem defendeu publicamente durante a campanha eleitoral. No entanto, segundo ele, Juliana evitou se envolver no caso e o deixou desamparado.
“Como a prefeita não se importa com alguém que chegou a ser processado na campanha eleitoral por defendê-la? Essa pessoa mudou, né?”, questiona Kauan, demonstrando indignação com a postura da chefe do Executivo.
Ele faz referência a um processo judicial que enfrenta, movido pela ex-secretária de Desenvolvimento e Inclusão Social, Christina Barichello, que cobra uma indenização de R$ 40 mil por danos morais. A ação foi motivada por um episódio no qual Kauan, durante a campanha, rebateu publicamente um vídeo de Christina, no qual ela insinuava uma aliança entre Juliana Pavan e o PT.
Apesar da decepção, Kauan afirma que não considera que Juliana tenha se tornado arrogante, mas sim que mudou completamente sua postura como prefeita. Durante a campanha, segundo ele, Juliana se apresentava como uma mulher forte, determinada e independente, mas, ao assumir o cargo, tornou-se “um fantoche de homens ricos e poderosos”, cujos nomes ele preferiu não mencionar.
Em um vídeo publicado nas redes sociais, Kauan compartilhou sua reflexão sobre a prefeita e sua gestão, demonstrando sua frustração com o rumo do governo municipal:
“Afinal, quem é Juliana? Quero saber onde está aquela mulher que se tornou prefeita, que era o sonho de tantos munícipes, a primeira mulher a comandar essa cidade. Uma prefeita com ‘P’ maiúsculo. O que vejo agora é uma verdadeira marionete nas mãos de grandes ditadores. Isso é inaceitável.”
“Temo pela minha vida”: Kauan relata abalo emocional e psicológico
O artista e suplente de vereador Kauan Quadros Serafim afirma que registrou o boletim de ocorrência por temer pela própria segurança e revela estar profundamente abalado psicologicamente com tudo o que aconteceu. Ele denuncia que a perseguição política e os episódios de intimidação não são apenas uma disputa de bastidores, mas algo que tem impactado diretamente sua saúde mental e emocional.
“Portanto, foi essa atitude que eu tive: registrar um boletim de ocorrência, temendo pela minha própria vida. Isso é óbvio. A única forma que eu tenho hoje de me defender são as provas que eu tenho, não só comigo, mas também com pessoas de minha confiança. E agora, aqui, nas redes sociais. A perseguição não é brincadeira. Muitas pessoas, por conta de perseguição, já chegaram a tirar até a própria vida. Então, é algo muito perigoso, e não estão levando em consideração nada sobre o meu abalo emocional e psicológico.”
Kauan reforça que, diante do cenário que enfrenta, sente-se mais seguro compartilhando sua versão publicamente. Ele destaca que, em sua visão, o serviço público em Balneário Camboriú deveria atender a toda a população, e não apenas às elites da cidade.
“E como eu sei que essa gente acha que eu não tenho ninguém por mim, eu tenho vocês. Estou aqui, sim, compartilhando isso com vocês, porque me sinto mais seguro falando tudo. Eu conto com todos vocês para que a justiça seja feita nessa situação e para que Balneário Camboriú tenha um serviço público de fato voltado para toda a população, e não apenas para a classe milionária desta cidade.”
O artista afirma que sua luta agora será para que sua denúncia seja levada a sério e que medidas sejam tomadas para evitar que situações como essa se repitam com outras pessoas dentro da administração municipal.